Foto tirada em 4 de abril de 2024 mostra uma cerimônia de colocação de coroa de flores na sede da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) em Bruxelas, Bélgica. (Xinhua/Zhao Dingzhe)
O presidente ucraniano Volodymyr Zelensky indicou pela primeira vez que Kiev poderia aceitar o controle russo sobre alguns de seus territórios em troca de sua adesão à Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN). A nova postura é amplamente vista como uma resposta à vitória de Donald Trump na última eleição presidencial dos EUA, enquanto sua aspiração de entrar para a OTAN diminuiu ainda mais.
Kiev/Moscou, 1º dez (Xinhua) -- Em uma mudança significativa de posição sobre um possível cessar-fogo após 33 meses de conflito, o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky indicou pela primeira vez que Kiev poderia aceitar o controle russo sobre alguns de seus territórios em troca de sua adesão à Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN).
A nova postura da Ucrânia é amplamente vista como uma resposta à vitória de Donald Trump na última eleição presidencial dos EUA, enquanto sua aspiração de ingressar na OTAN diminuiu ainda mais, pois as diferenças entre o plano de paz de Zelensky e a política de Trump continuam substanciais.
Foto tirada em 15 de agosto de 2024 mostra um tanque ucraniano destruído durante ataques russos em Toretsk. (Foto por Peter Druk/Xinhua)
GRANDE CONCESSÃO
Em uma entrevista à Sky News do Reino Unido, Zelensky respondeu a uma pergunta sobre a sugestão do presidente eleito dos EUA, Donald Trump, de que a Ucrânia ceda terras ocupadas pela Rússia para se juntar à OTAN, dizendo que a Ucrânia deve colocar os territórios desocupados sob a proteção da OTAN primeiro e buscar a devolução das terras ocupadas diplomaticamente.
"Se quisermos interromper a fase intensa da guerra, precisamos colocar os territórios desocupados da Ucrânia sob a proteção da OTAN", disse Zelensky. "Precisamos agir o mais rápido possível e, então, poderemos recuperar diplomaticamente as terras ocupadas."
De acordo com o texto de uma carta vista pela Reuters na sexta-feira, o ministro das Relações Exteriores da Ucrânia, Andrii Sybiha, também pediu a seus colegas da OTAN que enviem um convite a Kiev em uma reunião em Bruxelas na próxima semana para se juntar à aliança militar ocidental.
"O convite não deve ser visto como uma escalada", escreveu Sybiha na carta. "Pelo contrário, com um entendimento claro de que a adesão da Ucrânia à OTAN é inevitável, a Rússia perderá um de seus principais argumentos para continuar essa guerra injustificada."
A Ucrânia diz que aceita que não pode se juntar à aliança até que a guerra termine, mas estender um convite agora mostraria ao presidente russo Vladimir Putin que ele não poderia alcançar um de seus principais objetivos - impedir Kiev de se tornar um membro da OTAN, disse uma reportagem da Reuters.
Apesar da mudança de posição, o lado russo parece ter uma resposta muito discreta em relação à declaração de Zelensky, já que o Kremlin até agora não se manifestou sobre suas observações. Leonid Slutsky, presidente do Comitê de Assuntos Internacionais da Duma russa, no entanto, conclamou os políticos ucranianos a abandonarem sua ambição de entrar para a OTAN.
Moscou não permitirá mais que os países ocidentais "armem Kiev sob o disfarce de um acordo", disse ele em seu canal no Telegram. "Kiev está tentando entrar para a OTAN, essa é a chave para seguir em frente, não o fim da guerra. A ideia de congelar o conflito também é inaceitável."
O ex-presidente dos EUA Donald Trump (c) é entrevistado após o primeiro debate presidencial com a vice-presidente dos EUA Kamala Harris na Filadélfia, Estados Unidos, em 10 de setembro de 2024. (Xinhua/Li Rui)
FATOR TRUMP
"Ele (Zelensky) sabe que Trump está prestes a cair sobre ele e sobre a Rússia. Ele já está se preparando para ter algo a oferecer", disse Tony Brenton, ex-embaixador britânico na Rússia, ao jornal britânico The Independent, elogiando Zelensky por ‘jogar um jogo muito sofisticado’.
Apesar da promessa que Trump fez de acabar com o conflito russo-ucraniano em "24 horas", ele quase não elaborou esse plano. Mas ao nomear Keith Kellogg, ex-conselheiro de segurança nacional e tenente-general aposentado do exército dos EUA, como seu enviado especial para a Ucrânia, é possível ter uma ideia disso.
Em abril, Kellogg foi coautor de um plano chamado "América Primeiro: Rússia e Ucrânia", que congelaria as linhas de frente na Ucrânia e pressionaria Kiev e Moscou a se aproximarem da mesa de negociações.
No plano, divulgado pelo Instituto de Políticas América Primeiro, Kellogg observou que "até hoje, os Estados Unidos não têm um tratado de defesa com a Ucrânia e o país não é um aliado da OTAN. Intervir na guerra na Ucrânia não é um interesse nacional claro e vital dos EUA".
Os Estados Unidos continuarão a armar a Ucrânia e a fortalecer suas defesas para garantir que a Rússia não faça mais avanços e não ataque novamente após um cessar-fogo ou acordo de paz, disse ele, acrescentando que a futura ajuda militar americana exigirá que a Ucrânia participe de negociações de paz com a Rússia.
Para convencer a Rússia a participar das conversações de paz, os líderes da OTAN deveriam se oferecer para adiar o pedido de adesão da Ucrânia à OTAN. Além disso, poderia ser oferecido à Rússia algum alívio nas sanções, com a condição de que ela assinasse um acordo de paz com a Ucrânia, acrescentou.
As diferenças entre o plano de paz de Zelensky e a política de Trump ainda são substanciais, mas ao se envolver com a ideia de um cessar-fogo e sacrifícios territoriais dolorosos, o líder ucraniano está fazendo o máximo para parecer construtivo, disse uma reportagem da BBC.
O presidente ucraniano Volodymyr Zelensky fala à mídia antes de uma cúpula do Conselho Europeu em Bruxelas, Bélgica, em 27 de junho de 2024. (Xinhua/Zhao Dingzhe)
PERSPECTIVA INSTÁVEL
A Ucrânia está em um caminho declarado em direção à adesão à OTAN desde a Cúpula de Bucareste de 2008, onde os aliados da OTAN concordaram que a Ucrânia acabaria por se juntar à aliança. Mas ainda não emitiu um convite formal nem estabeleceu um cronograma.
Na cúpula de 2024 em Washington, os membros da OTAN reafirmaram que continuariam a apoiar "seu caminho irreversível para a plena integração euro-atlântica, incluindo a adesão à OTAN" e que estariam em posição de estender um convite à Ucrânia para se juntar à Aliança quando "os membros concordarem e as condições forem atendidas".
Olha Stefanishyna, vice-primeira-ministra da Ucrânia encarregada dos assuntos da OTAN, disse que Kiev entendeu que o consenso para um convite para ingressar na OTAN "ainda não existe", mas que a carta tinha o objetivo de enviar um forte sinal político.
"Enviamos uma mensagem aos aliados de que um convite não está fora de cogitação, independentemente das diferentes manipulações e especulações em torno disso", disse ela à Reuters.
A adesão da Ucrânia à aliança depende, em grande parte, da aprovação dos Estados Unidos, mas como Trump deve assumir o cargo em menos de dois meses, essa possibilidade diminuiu ainda mais.
Não fazia sentido nem mesmo fazer alusão ao apoio à eventual adesão da Ucrânia à OTAN, pois isso exigiria um voto unânime dos membros da OTAN, o que na época era altamente improvável, disse Kellogg em seu plano.
A Ucrânia também precisava atender a requisitos rígidos de adesão, incluindo reformas democráticas e militares que incluíam o alinhamento das forças armadas ucranianas com os equipamentos da OTAN, disse ele.
"A Ucrânia mantém sua soberania independente, a Rússia obtém a garantia de neutralidade da Ucrânia - ela não entra na OTAN, não entra em algumas dessas instituições aliadas. É assim que o acordo vai se parecer no final das contas", disse o vice-presidente eleito dos EUA, J.D. Vance.