Presidente dos EUA, Donald Trump, mostra ordem executiva sobre "tarifas recíprocas" no Rose Garden da Casa Branca em Washington, D.C., Estados Unidos, no dia 2 de abril de 2025. (Xinhua/Hu Yousong)
"Elas não impulsionarão o crescimento. São essencialmente um imposto sobre o trabalhador americano médio", disse Hoffman, CEO e presidente da Founders Space.
Washington, 3 abr (Xinhua) — Em meio à oposição generalizada, o presidente dos EUA, Donald Trump, assinou na quarta-feira uma ordem executiva sobre as chamadas "tarifas recíprocas". Chamando o dia de "Dia da Libertação", Trump afirmou que tarifas mais altas aumentariam a receita do governo e revitalizariam a indústria dos EUA.
No entanto, as "tarifas recíprocas" de Trump sobre os parceiros comerciais dos EUA podem mesmo ajudar a tornar a América grande novamente? Provavelmente não.
Após seu anúncio sobre tarifas abrangentes, economistas criticaram a última ação de Trump, alertando que isso poderia levar a uma guerra comercial que ameaça aumentar a inflação e paralisar o crescimento econômico dos EUA e do mundo.
QUAIS SÃO AS "TARIFAS RECÍPROCAS" DE TRUMP?
Chamando a abordagem das tarifas recíprocas de uma estratégia de retaliação visando corrigir desequilíbrios comerciais, Trump, em seu discurso no Rose Garden da Casa Branca, disse: "Recíproco. Significa que eles fazem isso conosco e fazemos o mesmo com eles. Muito simples".
"Cobraremos deles aproximadamente metade do que eles estão, e têm, nos cobrado", acrescentou ele.
Trump assinou uma ordem executiva promulgando uma "tarifa mínima de base" de 10% sobre todas as importações, com taxas mais altas para certos parceiros comerciais, em vigor em 5 de abril, exceto para isenções especificadas.
Além disso, a partir de 9 de abril, Trump irá impor uma "tarifa individualizada recíproca mais alta" sobre os países e regiões com os quais os Estados Unidos "têm os maiores déficits comerciais", de acordo com um documento da Casa Branca.
Alguns produtos não estarão sujeitos às tarifas recíprocas, incluindo aço e alumínio, além de automóveis e autopeças já sujeitos às tarifas da Seção 232, cobre, produtos farmacêuticos, semicondutores e madeira, disse a Casa Branca.
Durante seu discurso, Trump mostrou um gráfico sobre "tarifas recíprocas", destacando as novas taxas tarifárias para diferentes parceiros comerciais, sendo União Europeia (UE) 20%, Japão e Malásia 24%, Índia 26%, Indonésia 32%, Vietnã 46% e Camboja 49%.
Trump também se reservou o direito de aumentar a taxa básica "caso a capacidade de fabricação e a produção dos EUA continuem piorando".
Essas tarifas permaneceriam em vigor até que Trump determinasse que a ameaça representada pelo déficit comercial e tratamento não recíproco subjacente foi "atendida, resolvida ou mitigada".
"Embora o Sr. Trump tenha dito por semanas que imporia ‘tarifas recíprocas’, seu anúncio foi muito além do que muitos economistas e analistas esperavam", relatou o The New York Times.
Gary Clyde Hufbauer, membro sênior não residente do Instituto Peterson de Economia Internacional, disse: "Não há base para as taxas equivalentes a tarifas reivindicadas impostas por outros países. Isso é pura invenção".
Presidente dos EUA, Donald Trump (atrás), comenta sobre "tarifas recíprocas" no Rose Garden da Casa Branca em Washington, D.C., Estados Unidos, no dia 2 de abril de 2025. (Xinhua/Hu Yousong)
POR QUE IMPOR "TARIFAS RECÍPROCAS"
Trump alegou que outros parceiros comerciais impõem "barreiras não monetárias" aos Estados Unidos, com o gráfico que ele apresentou durante seu discurso ilustrando as tarifas "cobradas" por diferentes países ou regiões aos Estados Unidos, incluindo "manipulação de moeda" e "barreiras comerciais".
Afirmando que muitos parceiros comerciais dos EUA têm aproveitado as baixas tarifas dos EUA enquanto mantêm impostos mais altos sobre produtos americanos, Trump invocou sua autoridade sob a Lei de Poderes Econômicos de Emergência Internacional de 1977 para "abordar a emergência nacional representada pelo grande e persistente déficit comercial".
O grande déficit é motivado pela "ausência de reciprocidade em nossas relações comerciais e outras políticas prejudiciais, como manipulação de moeda e impostos exorbitantes sobre valor agregado (IVA) impostos por outros países", de acordo com o governo Trump.
Expressando sua crença de que as tarifas são necessárias para garantir o comércio justo, proteger os trabalhadores americanos e reduzir o déficit comercial, Trump afirmou que "empregos e fábricas voltarão com força total" e que as tarifas recíprocas inaugurariam uma "era de ouro" para o país.
"Vamos turbinar nossa base industrial doméstica. Vamos abrir mercados estrangeiros e quebrar barreiras ao comércio exterior. No final das contas, mais produção em casa significará uma competição mais forte e preços mais baixos para os consumidores", disse Trump.
Alguns especialistas sugeriram que o objetivo real do anúncio de tarifas de Trump é pressionar outras nações a negociar acordos comerciais mais favoráveis ao governo Trump.
O anúncio de "tarifas recíprocas" é "só outra tática de barganha de Trump", disse o economista americano Jack Rasmus, autor de "The Scourge of Neoliberalism" ("O Flagelo do Neoliberalismo", em tradução livre).
Clay Ramsay, pesquisador do Centro de Estudos Internacionais e de Segurança da Universidade de Maryland, disse à Xinhua que, ao impor "tarifas recíprocas", Trump queria que os Estados Unidos estivessem em uma posição de barganha superior na qual "pudessem reter algo que o outro país deseja ou extrair uma concessão em alguma outra área".
EFEITOS ADVERSOS
"O presidente Donald Trump está intensificando sua enorme guerra comercial global, um movimento que certamente pesará nas carteiras dos americanos e pode levar a economia dos EUA a uma recessão dolorosa", disse uma reportagem da CNN.
O congressista americano Josh Gottheimer alertou que as tarifas de Trump são "regressivas", chamando o dia do anúncio de "um dia de custos mais altos e de caos".
Muitos economistas acreditam que "tarifas recíprocas" impostas a parceiros comerciais importantes seriam difíceis de estruturar e poderiam prejudicar o comércio global, aumentando os custos para consumidores e empresas dos EUA.
"Tarifas são impostos sobre empresas que trazem produtos para o país. Elas precisam pagar o imposto para que isso seja admitido", disse Chris Barrett, professor da Faculdade de Negócios Cornell SC Johnson. "Você acaba de adicionar um custo para a empresa, e esses custos são repassados, pelo menos até certo ponto, para os consumidores".
Na pesquisa de confiança do consumidor mais recente da Universidade de Michigan, as expectativas de inflação de longo prazo dos consumidores tiveram o maior salto de três meses já registrado e atingiram seu nível mais alto em mais de três décadas.
O laboratório de orçamento da Universidade de Yale projetou que uma tarifa ampla de 20% poderia levar a um aumento de curto prazo nos preços ao consumidor variando de 2,1%, supondo que não haja retaliação de outros países, a 2,6% se medidas de retaliação forem promulgadas.
"Acho que essas tarifas adicionarão 1,5% à taxa de inflação dos EUA", previu Hufbauer, que também é ex-funcionário do Departamento do Tesouro.
"As tarifas anunciadas estão no extremo das previsões", disse ele, acrescentando que é "difícil ver os EUA evitando uma recessão. O crescimento mundial cairá 1% ou mais".
Também expressando preocupação, o empreendedor do Vale do Silício, Steve Hoffman, disse: "Não acho que as tarifas recíprocas vão ajudar ninguém. Elas não vão trazer empregos de volta aos Estados Unidos e só vão aumentar o custo dos produtos. Os consumidores americanos acabarão pagando esse custo, de uma forma ou de outra".
"Elas não vão impulsionar o crescimento. São essencialmente um imposto sobre o trabalhador americano médio. Se as tarifas globais forem amplamente implementadas, os preços aumentariam, os gastos do consumidor cairiam e um ciclo econômico descendente provavelmente começaria", disse à Xinhua, Hoffman, CEO e presidente da Founders Space, uma das principais incubadoras do Vale do Silício.
Da mesma forma, Ramsay disse que mesmo que o plano funcione, o problema para a maioria das partes da sociedade pode ser extraordinário. "Para começar com os ricos, eles perderão financeiramente no início", disse ele.
Foto tirada no dia 4 de agosto de 2022 mostra Casa Branca e placa de pare em Washington, D.C., Estados Unidos. (Xinhua/Liu Jie)
REAÇÃO GLOBAL
O anúncio de Trump sobre "tarifas recíprocas" atraiu ampla oposição e críticas da comunidade internacional e dos círculos empresariais.
As políticas tarifárias dos EUA estão aumentando as incertezas globais e terão um impacto negativo em todo o mundo, disse a presidente do Banco Central Europeu, Christine Lagarde.
A primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni, criticou a decisão de Trump de impor tarifas à União Europeia (UE), chamando-a de "um erro que não beneficia ninguém".
Chamando a decisão de Trump de "profundamente lamentável", o Taoiseach (chefe de governo) irlandês, Micheal Martin, disse que ela não beneficia "ninguém". "A UE precisará responder de forma proporcional que proteja nossos cidadãos, trabalhadores e negócios", disse o vice-primeiro-ministro irlandês, Simon Harris.
O primeiro-ministro australiano, Anthony Albanese, condenou as novas tarifas dos EUA sobre importações do país como "injustificadas" e "um ato não amigável".
Em resposta às tarifas dos EUA, o governo brasileiro disse que o país "está avaliando todos os cursos de ação possíveis para garantir a reciprocidade no comércio bilateral, incluindo recorrer à OMC (Organização Mundial do Comércio), em defesa dos legítimos interesses nacionais do Brasil".
O primeiro-ministro canadense, Mark Carney, prometeu combater as tarifas com medidas retaliatórias, dizendo que as taxas "mudariam fundamentalmente o sistema de comércio global".
Observando que este é o maior aumento de impostos que os Estados Unidos já viram, Dean Baker, economista sênior do Centro de Pesquisa Econômica e Política, disse que "haverá sérias retaliações de todos os parceiros comerciais dos EUA".
"Tudo o que isso faz é alimentar uma guerra comercial, criando incerteza e instabilidade nos mercados. Interrompe a atividade econômica e arrisca desencadear uma recessão global", disse Hoffman.